Blog pessoal, de ''mim para mim''. Faíscas de luzes e contornos da minha sombra... Mas quem quiser também, esteja a vontade.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Tomé

(Do livro, JESUS, O FILHO DO HOMEM, de Gibran Khalil)
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Meu avô, que era um homem da lei, certa vez disse: ”Obedeçamos à verdade, mas apenas quando a verdade é-nos manifesta”.
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Quando Jesus me chamou eu obedeci, pois Seu comando era mais forte que minha vontade; todavia, eu mantive meu alvitre.
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Quando Ele falava e os outros vergavam como galhos ao vento,eu O ouvia imóvel. Eu O amava.
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Há três anos Ele nos deixou. Formamos um grupo disperso para cantar Seu nome e ser Suas testemunhas perante as nações.
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Por esse tempo eu era chamado Tomé, o incrédulo. A sombra de meu avô ainda estava sobre mim, e eu sempre queria que a verdade me fosse manifestada.
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Eu queria mesmo colocar minha mão em minha própria ferida para sentir o sangue antes de acreditar em minha dor.
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Ora, um homem que ama com o coração e mantém a dúvida em sua mente, é como o escravo nas galés, que dorme no remo e sonha com a liberdade, até que o azorrague do feitor o acorde.
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Eu mesmo era este escravo que sonhava com a liberdade, mas o sono de meu avô pairava sobre mim. Minha carne precisava do látego de meu próprio dia.
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Mesmo na presença do Nazareno, eu fechava os olhos e via minhas mãos acorrentadas ao remo.
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A dúvida é uma dor solitária demais para saber que a fé é sua irmã gêmea.
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A dúvida é uma criança abandonada, infeliz e extraviada que, embora sua mãe que deu-lhe a vida a encontre e a envolva, se retrai por medo e precaução.
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A dúvida não conhecerá a verdade até que suas feridas sejam sanadas e restauradas.
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Eu duvidei de Jesus até que Ele se manifestou para mim, e meteu minha mão em suas próprias feridas.
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Então realmente acreditei e depois disso libertei-me do meu passado e do passado de meus ancestrais.
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Os mortos dentro de mim enterraram seus mortos; e os vivos viveram para o Rei Ungido, esse que era o Filho do Homem.
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Ontem me disseram que deveria ir proclamar Seu nome entre os Hindus e Persas.
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Eu irei. E desde esse dia até meu último dia, ao amanhecer e ao anoitecer, verei meu Senhor erguer-Se em sua majestade e O ouvirei falar.
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domingo, 7 de fevereiro de 2010

Salomé - a uma amiga



(Do livro, JESUS, O FILHO DO HOMEM, Gibran Khalil)
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Ele era como os álamos a bruxulear no sol;
E como um lago por entre as colinas solitárias,
Brilhando ao sol;
E como a neve sobre as altas montanhas,
Branca, branca ao sol.
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Sim, Ele era como tudo isso,
E eu O amava.
Embora eu temesse Sua presença,
Meus pés não podiam suportar meu fardo de
quebrantamento
Para que eu pudesse envolver Seus pés com meus braços.
Eu teria Lhe dito:
“Eu matei Teu amigo em um momento de paixão.
Perdoarás meu pecado?
E não absolverás, em Tua misericórdia, minha juventude
De seu cego agir,
Para que possa seguir em Tua luz?”.
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Eu sei que Ele teria perdoado minha dança
Pela santa cabeça de Seu amigo.
Sei que Ele teria visto em mim
Um objeto de Seu próprio ensinamento.
Pois não havia vale de fome que Ele não pudesse atravessar,
E nem deserto de sede que não pudesse cruzar.
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Sim, Ele era como os álamos,
E como os lagos entre as montanhas,
E como a neve no Líbano.
E teria eu refrescado meus lábios nas dobras de Sua veste.
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Mas Ele estava longe de mim,
E eu andava envergonhada.
Minha mãe segurou-me para trás
Quando o desejo de buscá-Lo se apossou de mim.
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Sempre que Ele passava,
Meu coração ansiava pela formosura de Seu olhar distante e perto,
Mas minha mãe franzia-se em desdém,
Afastava-me da janela, e eu ia
Para meu quarto de dormir.
E ela gritava alto, dizendo:
“Quem é Ele, senão outro comedor de gafanhotos do deserto?
O que é Ele senão um zombador e um renegado,
Um sedicioso agitador que nos roubaria o cetro e a coroa,
E convidaria as raposas e os chacais de Sua terra maldita
A que uivassem em nossas salas e sentassem em nosso trono?
Vá esconder tua face desse dia,
E espera pelo dia em que Sua cabeça caia,
Mas não na tua bandeja”.
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Estas coisas minha mãe dizia.
Mas meu coração não guardava suas palavras.
Eu O ansiava em segredo,
E meu sono era povoado por trevas.
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E agora Ele se foi.
E algo que havia em mim também se foi.
Talvez tenha sido minha juventude
Que não queria demorar-se por aqui,
Desde que o Deus da juventude foi morto.

Música das auroras

sábado, 6 de fevereiro de 2010

No atemporal

Lá onde o tempo não passa...
Não passa porque não conta.
Não conta porque não sabe...
E mesmo se soubesse, não seria preciso.
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Lá estendi minhas roupas, meus sapatos,
e até meu relógio, artefato ultrapassado.
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Lá, sentei-me numa taubinha,
enconstei a ponta de meu pé no rio lento,
e atirei uma pequena pedra no horizonte perto-distante.
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Senti um frio que não era gelado;
Senti uma falta de ar que não era o meu ar;
Senti um fim que não era a morte:
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Era o Encontro que se encontraria com um perdido!?
Era o Espelho que tornaria nua minha nueza!?
Era o silêncio que calaria meu ruído mudo!?
Eu não sei.
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Ergui-me,
não pelos meus pés,
Mas sobre meu ser.
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Respirei, mas não o ar atmosférico, não o ar que infla os pulmões,
Mas o ar que enche a consciência de terna luz.
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Estendi minhas mãos para o além.
Agarrei-me no vazio de minha raza profundeza.
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Silêncio.
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Inquietei-me,
Aquietei-me,
Virei-me, e mais uma vez, levei dentro de mim
A escuridão como luz
O silêncio como resposta.
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(by Charles, fevereiro de 2010 )